domingo, 27 de julho de 2008


Hoje acordei com vontade de poesia...

Pensei, porque não falar de amor, porque não falar de dor...

Escolhi
Florbela Espanca...

Deliciem-se

MAIOR TORTURA

Na vida, para mim, não há deleite.
Ando a chorar convulsa noite,
E não tenho nem sombra em que me acoite,
E não tenho uma pedra em que me deite!

Ah! Toda eu sou sombras, sou espaços!
Perco-me em mim na dor de ter vivido!
E não tenho a doçura duns abraços
Que me façam sorrir de ter nascido!

Sou como tu um cardo desprezado
A urze que se pisa sob os pés,
Sou como tu um riso desgraçado!

Mas a minha Tortura inda é maior:
Não ser poeta assim como tu és
Para concretizar a minha Dor!

Florbela Espanca - Trocando olhares

* Como o mesmo título de “A Maior Tortura”, e dedicado “A um grande poeta de Portugal”, este soneto comparece refundido em Livro de Mágoas.

NOIVADO ESTRANHO


O luar branco, um riso de Jesus,
Inunda a minha rua toda inteira,
E a Noite é uma flor de laranjeira
A sacudir as pétalas de luz…

A luar é uma lenda de balada
Das que avozinhas contam à lareira,
E a Noite é uma flor de laranjeira
Que jaz na minha rua desfolhada…

O Luar vem cansado, vem de longe,
Vem casar-se co´a Terra, a feiticeira
Que enlouqueceu d´amor o pobre monge…

O luar empalidece de cansado…
E a noite é uma flor de laranjeira
A perfumar o místico noivado!…

Florbela Espanca - Trocando olhares - 30/04/1917